terça-feira, novembro 23, 2004

OPERAÇÃO?

Estou de volta ao Hospital Egas Moniz para uma consulta de Urologia.
– Então, diga-me lá como é que isso está, – pergunta o meu médico urologista, o Doutor José Luís Barreto, com a sua cara habitual de couldn’t care less.
– Bem... continuo sem conseguir urinar, – respondo eu.
– Por cima ou por baixo? – rosna o homem, – Tem que especificar!
Hesito perante a rudeza inesperada do homem. Mas este gajo está armado em parvo? Que eu saiba, “mijar” é pela pila e não pelo cateter! Além disso, se eu porventura não conseguisse mijar pelo cateter, de certeza que não estava tão descansado da vida, ó esperteza saloia!
– Por baixo, claro, – replico, civilizadamente.
– Então não sai nada por baixo?
– Não. Quer dizer, vai sempre saindo qualquer coisa, que eu sinto, mas --
– Que é isso de sentir? Sente, como? Sente o quê?
– Bom, durante o dia, nos meus afazeres diários --
– Ou à noite, a dormir. É em sonhos que você sente, não é? Só pode ser.
É que o gajo está mesmo armado em parvo! Cretino do caraças! Mas, desta vez, não me fico e...
– Espere lá! Se eu sinto umas gotas a sair ao longo do dia e depois vejo as cuecas manchadas é porque está necessariamente a sair alguma coisa, não é?
O médico esboça um esgar céptico.
– Não necessariamente. Seja como for, umas gotas pouco interessam. Tem é que haver jacto. Jacto! Isso é que conta. Você tem que ver. Sentir não é nada.
– Bom, jacto não há. É como lhe disse.
– Não há jacto.
– Não.
– Bom.
Por momentos, o médico rabisca algo num papel. Pausa. Subitamente, levanta os olhos para mim:
– Claro que já se apercebeu que vai ter de ser operado, não é?
– Eu já calculava, sim.
– Já passaram mais de dois meses desde o acidente e ainda nada... Mas, vamos fazer uma uretrografia, antes de marcarmos a operação. E, segundo o resultado do exame, logo decidimos.

Abandono o consultório com uma mistura de sentimentos contraditórios. Apesar de não querer ir à faca, quero muito ver este problema de obstrução urinária resolvido de uma vez por todas, portanto... acho que até estou feliz por tudo isto se resolver em breve. Contudo, há algo que me desagrada cada vez mais nesta situação: o facto de estar a desenvolver uma intensa antipatia pelo médico, que, consequentemente, abala a confiança que nele deposito. É verdade que nada posso afirmar sobre as suas aptidões clínicas, pois careço de dados em que fundamentar a minha opinião, contudo, como ser humano, o raio do homem é uma nódoa.

Que mania que o tipo tem de tratar os pacientes como se fossem atrasados mentais! Concedo que seja psicologicamente desgastante passar o dia inteiro a ouvir os queixumes de pessoas que não conseguem mijar direito, mas, caramba!, se o gajo não tem paciência para o fazer, que desista da Medicina, que diabo! Eu não tenho que o aturar, mais ao seu mau humor e às suas frustrações sexuais (pois é óbvio que o seu mau humor deriva de grandes problemas de ordem sexual).

Quer-me cá parecer que, antes de toda esta aventura acabar, ainda vou ter que me chatear a sério com o médico... O gajo que insista em tratar-me como um atrasado mental e vai ver como o Jacaré morde. Muita sorte teve ele por eu não lhe ter afinfado um pontapé nas canelas por baixo da mesa – e depois atirado-lhe à cara que era tudo um sonho dele: “Você tem que ver. Sentir não é nada.”

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