domingo, outubro 08, 2006

OS RICOS E OS POBRES

Almoço em casa da minha doce namorada. Na televisão, após a emissão das notícias, estreia o novo reality show da TVI: “Pedro, o Milionário.” Aqui, um betinho qualquer é transformado em milionário, com direito a herdade com terras a perder de vista, um enorme solar ao fundo de uma alameda arborizada, cavalos de raça e carro desportivo, um mordomo cheio de spleen e ainda aulas de dança, equitação e etiqueta e boas maneiras, para ensinar o menino bem a comportar-se na sua nova pele de menino rico. A sua missão é escolher uma princesa – que o ame por quem é e não pelo seu dinheiro – de entre um grupo de 14 pretendentes seleccionadas pela produção. Elas, contudo, não fazem ideia que ele é um príncipe encantado fajuto, de fabricação televisiva. Estão lá para viver um conto de fadas na pele (com direito a jackpot a rivalizar o Euro Milhões, pois claro). No final, porém, o nosso príncipe de pechisbeque terá de revelar toda a verdade à sua escolhida. Nessa altura, saberemos se o poder do amor suplanta o dinheiro e a mentira.

É notório como o canal televiso está apostado em vender um verdadeiro conto de fadas, com direito a todos os melosos clichés da praxe. Logo o comprova a cena em que as candidatas a princesa são recebidas à chegada à mansão pelo solteirão mais apetecível da TVI. Imaginem isto: elas, expectantes, graciosamente dispostas frente à imponente fachada do solar, quando surge o distinto rapaz, ao dorso do seu nobre corcel, a trote pela alameda acima, emoldurado pela viçosa folhagem do arvoredo e com honras de acção reproduzida em câmara lenta e banda sonora épica de galã de telenovela venezuelana. Eu lanço uma imprecação de incredulidade – a manipulação é tão descaradamente óbvia que toca as raias do ofensivo! No entanto, para minha maior incredulidade (ou talvez não), logo os corações das meninas se derretem! Algumas confessam-se mesmo extasiadas perante a sublime imagem. Pela minha parte, não tenho dúvidas: as mulheres são enganadas pelos homens porque querem. E ainda dizem que “money can’t buy love.”

Após aquilo que constitui a primeira prova das meninas, chega a fatídica hora da primeira eliminatória. A tarefa do delicado príncipe é escolher 9 meninas do grupo de pretendentes para prosseguir para a fase seguinte. Como bons telespectadores que somos, a minha namorada e eu vamos dando as nossas opiniões sobre quem achamos que fica ou salta fora. “Esta tem cara de drogada; já foste.” “Esta tem um sorriso simpático; fica.” “Esta é esquelética e tem ar de sonsa; adeus.” “Esta é bem gira; fica.” “Mas esta é feia; salta.” E depois, reparando melhor, “Afinal, não. Tem um belo par de mamas; fica.” A minha namorada mostra-se chocada: “O quê?! porque tem um bom par de mamas, fica?!” Eu justifico: “Por si só, o par de mamas não a leva até à final, mas para passar a primeira eliminatória é mais que suficiente. Além disso, há lá outras gajas piores. Fica.” Ficou. E, curiosamente as minhas previsões acertaram, de um modo geral, na mouche.

A propósito da selecção de parceiras amorosas, refiro casualmente o sistema por mim desenvolvido para o mesmo fim, exposto no texto intitulado “Let The Games Begin,” de 13 de Outubro de 2004 (que convido agora o leitor a reler), explicando por alto a sua estrutura à minha namorada. “Ah, mas comigo tu não fizeste nada disso,” comenta ela, com um sorriso. “Isso é o que tu pensas,” digo eu. “O quê?!” O seu sorriso esvaece. “Mas tu nunca viste nenhuma foto minha em biquini, por exemplo!... Bem, a verdade é que não precisaste, porque me viste de biquini na praia... E, sim, antes de começarmos a namorar, saímos juntos bastantes vezes, com os meus amigos, com os teus, a sós... Ah! Seu sacana! Afinal já tinhas tudo programado desde o princípio! E eu não dei por nada!” Eu rio-me. No campo da sedução amorosa, um gajo tem que proceder sempre como quem não quer a coisa. O sucesso da caçada depende todo da subtileza do caçador.

Especialmente quando um gajo não tem uma herdade com cavalos, criados e afins.

2 Comentário(s):

A terça-feira, 07 novembro, 2006, Blogger matie comentou:

A arte e' fazer-te acreditar nisso tudo! Sorte a minha teres acreditado; Eu já contava com o conhecimento prévio desse astuto concurso.

Beijufa

 
A quarta-feira, 08 novembro, 2006, Blogger Jacaré Voador comentou:

“Ah! Sua sacana! Afinal já tinhas tudo programado desde o princípio! E eu não dei por nada!”

(Quer-me parecer que arranjei uma companheira ainda mais manhosa que eu...)

Enfim, uns dias são da caça, outros do caçador.

 

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